A passagem do controle das empresas de uma geração para a seguinte é um assunto delicado para toda empresa familiar. Um estudo realizado em 2013 por uma empresa de auditoria internacionalmente reconhecida, e que teve por objeto empresas familiares do Brasil, constatou que somente 50% dessas empresas sobrevivem à passagem para a segunda geração, 28% para a terceira geração, e 6% para a quarta geração e as seguintes.
O Direito conta com vários instrumentos que ajudam as empresas familiares a sobreviver às transições de gerações, instrumentos esses que se convencionou chamar de “planejamento sucessório”, e quando são utilizados sistematicamente, tornam-se muito eficientes para promover a boa continuidade do negócio.
O planejamento sucessório é a organização que alguém faz de seus bens em vida com o intuito de preservá-los após sua morte para as futuras gerações. Com isso, a pessoa minimiza riscos ou litígios entre os sucessores, atritos que poderiam levar à extinção da empresa.
Entre os princípios mais importantes do Direito Empresarial está o da preservação da empresa, a qual é uma célula produtiva da sociedade, que não interessa apenas aos seus sócios, mas também aos seus colaboradores, fornecedores, consumidores e à própria coletividade da qual faz parte.
O planejamento sucessório tem por objetivo ajudar os empresários a preservar os seus negócios para depois de sua morte ou então seu afastamento das atividades empresariais, com reestruturações societárias e tributárias modeladas (constituição de holdings de participação ou patrimonial) especialmente nos casos em que existem herdeiros em situações distintas, como aqueles que trabalham na empresa, aqueles que não trabalham, herdeiros casados, solteiros, com filhos, e sem filhos, entre outras situações.
Muito embora a Constituição Federal garanta a todos os filhos, gerados ou não da relação do casamento, ou resultantes de adoção, tendo os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação ou direito à herança (Constituição Federal, artigo 5o, XXX CC, artigo 227, § 6o), a lei infraconstitucional oferece alguns instrumentos para, como diria Rui Barbosa, “quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam”.
Entre esses instrumentos, podemos citar a doação da parte disponível do patrimônio. Segundo a lei civil (Código Civil, artigos 549 e 1.789), cada pessoa somente pode dispor por doação o que, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento, ou seja, de metade do seu patrimônio. O beneficiário dessas doações poderá ser qualquer pessoa, inclusive um dos herdeiros. Assim, o empresário poderá passar o controle para o herdeiro que se revele mais capaz de conduzir os negócios.
A antecipação da herança traz como vantagem uma passagem de controle menos conturbada entre as gerações, tendo em vista que, dependendo da formatação do planejamento, o inventário judicial poderá não ser mais necessário.
Entretanto, dependendo das composições familiar e empresarial, basear o planejamento apenas nas doações pode não ser suficiente para passar o controle a quem o fundador desejar. Diante disso, a lei permite, para se chegar à formatação necessária, o uso de outros meios, tais como acordos de acionistas e emissão de ações preferenciais.
O uso desses instrumentos de diferenciação, embora pareça injusto para o espectador que não conheça a realidade da empresa ou a da família, tem importância crucial para a manutenção da empresa familiar ao longo dos anos, possibilitando que ela tenha condições de chegar até a quarta geração e até mesmo mais além.
Artigo publicado na Revista Distribuição, nº 267, abril – 2015. Para ver clique aqui