Os sócios são livres para escolherem o método de apuração de haveres que mais lhe convierem no contrato social. A apuração de haveres ocorrerá quando houver dissolução parcial da sociedade, originada por morte, exercício de direito de retirada ou exclusão de sócio. Todavia, entende o Superior Tribunal de Justiça que, caso não haja consenso entre as partes quanto ao resultado alcançado pelo critério escolhido no contrato social, o balanço de determinação é o mais adequado. Trata-se de uma mudança, pois, até pouco tempo atrás, o método defendido pelo referido tribunal como mais adequado era o fluxo de caixa descontado.
A Quarta Turma do STJ, em julgamento do Recurso Especial n° 1.904.252 – RS (2020/0291023-0), no dia 22 de agosto de 2023, ratificou entendimento de que o método de fluxo de caixa descontado é inadequado para fins de apuração de haveres em ações de dissolução parcial de sociedade limitada. Defende, a corrente majoritária da Corte, que seja utilizado o método patrimonial com base no balanço de determinação[1].
A Relatora do Recurso supracitado, Ministra Maria Isabel Gallotti, defendeu, acompanhada dos demais Ministros da Turma, que a base de cálculo dos haveres deve ser o patrimônio da sociedade e, portanto, os valores que ainda não o integram não podem ser repartidos, excluindo a possibilidade de projeção de lucros futuros da sociedade. Sendo assim, caso omisso o contrato social, o sócio não pode receber valor diverso do que receberia na hipótese de dissolução total da sociedade.
Em julgamento semelhante[2], o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, da Terceira Turma, defendeu ainda que a metodologia do fluxo de caixa descontado pode trazer malefícios à sociedade, como incentivo ao descumprimento dos deveres por parte de sócios minoritários, incentivo ao direito de retirada e enriquecimento indevido, em detrimento daqueles que ficaram na sociedade. Porém, em sentido contrário, defendeu a Ministra Nancy Andrighi que o modelo de fluxo de caixa descontado deveria ser utilizado, pois objetiva estabelecer o preço de mercado da sociedade, ou seja, o valor patrimonial real da empresa, podendo tal modelo ser aplicado em conjunto com o balanço de determinação.
Para sustentar tal tese, a Corte se baseia em doutrina construída sobre decisão de 4 de maio de 1979, do STF, proferida em julgamento do RE 89.464/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Cordeiro Guerra, que decidiu que o art. 15 do Dec. 3.708/19[3] abria a possibilidade de sócio dissidente de alteração contratual retirar-se da sociedade, fazendo-o somente se o valor dos bens correspondesse exatamente ao valor real.
Portanto, caso uma das partes envolvidas na dissolução parcial ingresse com ação demonstrando inconformismo sobre a apuração da haveres, a apuração deverá ser realizada na forma indicada pela Corte Superior, reforçando o cenário de insegurança jurídica sobre matéria societária e a necessidade de realização de instrumentos adequados que possam ser interpretados sem a necessidade de intervenção judiciária.
A equipe societária de Dessimoni e Blanco Advogados está à disposição para quaisquer esclarecimentos.
[1] Método contábil específico para apuração de haveres em dissolução total de sociedade limitada, com objetivo de levantar o valor patrimonial real da empresa.
[2] REsp n. 1.877.331/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 13/04/2021, DJe de 14/05/2021.
[3] Legislação revogada pelo atual Código Civil. (“Art. 15. Assiste aos socios que divergirem da alteração do contracto social a faculdade de se retirarem da sociedade, obtendo o reembolso da quantia correpondente ao seu capital, na proporção do ultimo balanço approvado. Ficam, porém, obrigados ás prestações correspondentes ás quotas respectivas, na parte em que essas prestações forem necessarias para pagamento das obrigações contrahidas, até á data do registro definitivo da modificação do estatuto social.”)